quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Angola, um CAN e duas disputas


Nos estádios construídos à pressa e até mesmo atabalhoadamente, decorre o CAN 2010, enquanto fora deles, outro pleito acontece em confronto menos clássico mas nem por isso menos contundente. Tem árbitro também, ainda que discreto, com direito a mala sem fundo mas com descomunais capacidades de alienação e distribuição de cartões vermelhos. Corrupção para o beija-mão e cartão vermelho à resistência claro está!

Aconteceu muito naturalmente, mesmo até porque se o CAN é novo a disputa tem a idade do país politicamente constituído.

Opõe-se dois contendores sem lista divulgada e, claro está, com estatutos diferentes! Um, que sobrevive com as sobras dos manjares, para o qual estará sempre apontado o cartão vermelho e outro - o surdo e o invisual de conveniência - que faz da infelicidade do outro a sua felicidade. Pare este outro, como é devido, as benesses da mala do árbitro.

E começa o pleito que conhecerá sua rixa mais violenta - e muda também -, a partir do dia 21 de Janeiro de 2010, data da consolidação da última ditadura continental e mundial.


Teve início o invulgar pleito, alinhando-se os competidores segundo necessidades publicitárias e estratégicas.


Para a publicidade, o acesso aos estádios é feito de forma a fazer a acreditar que eles não estão rodeados de miséria e imundície, ao estilo "para inglês ver", mesmo sabendo-se que há coisas que nem inglês aceita enxergar. O monopólio é visível, já que aqueles que denunciaram os lacaios do imperialismo se transformaram na trincheira firme da Pilhagem Mundial. Transportes favorecidos, fabricação e distribuição exclusiva de bilhetes, venda de águas, sumos e outros produtos derivados ou fabricados com gengibre ou cola, enfim, um campeonato "do partido", organizado e apadrinhado pela rede continental de atormentadores dos povos de África. Dos atabalhoados, desde as estradas que há trinta e quatro anos aguardam por intervenção séria, à iluminação pública e doméstica desleixados, formam um plantel, enquanto os pequenos condomínios com a marca da discriminação formam o outro.


Os estrategas da pátria optaram por organizar o seu quotidiano sem algazarra, deixando que desporto e evento prosseguissem seus objectivos de alienação sem lhes toldar a mente.

Ao toque do árbitro, situacionistas ferrenhos e apoiantes de esterco flamejam as bandeiras julgadas unificadoras e suas trombetas! Opositores declarados e resistentes anónimos, aguardam calma e serenamente pelo esfumar da glória efémera dos seus opressores. Que pleito admirável!

Bandeira à vermelho e preto? Usa tu! O “jogo”sujo? É vosso! A miséria? É nossa! Os discriminados? Somos nós! Não conseguiram um Filipão para a mobilização geral? Os nossos problemas são conhecidos! Gritem, gesticulem, disfarcem, corrompam, finjam unidade, mas o jogo real está aí, sem plateia direccionada e à vista de qualquer um, mesmo aos invisuais de consciência!

O resultado já foi encontrado! A consciência nacional vetou a prática do uso do desporto como forma pérfida de moldagem do raciocínio.

Vetou a criação de um Clube de Amigos fundado na insensatez; desagradou-se ante a transformação dos mesmos em assembleia constituinte; rejeitou a humilhação de ver uma constituição e seu conteúdo serem pisados e lançados ao espólio, por conveniência de alguns; angustiou-se porque a seriedade não mora entre nós e o que se pretendia um país sério, será doravante um acabada propriedade horizontal!

A ignomínia de presentear o povo angolano com um evento desportivo enquanto se planifica o cerceamento das suas aspirações e liberdade, não vingou! Cegou alguns mas não vingou. Pior do que isso, distinguiu as lideranças africanas com a Taça da Amargura.