sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Luanda, Nova vida, velhas praticas







Se a vida mudou ou não, só os moradores podem avaliar. De onde saíram, para aonde querem ou gostariam de ir, a vida é assim mesmo, pois que apesar de estarmos juntos, não somos nem queremos ser iguais.

Bairro militar? Não sei mas  é o que dizia a tabuleta propagandista. Desapareceu clandestinamente sem que anunciassem se acabou o bairro militar ou se foi roubada a placa para fazer lenha, tanta é a miséria escondida.
Militar ou militarizado, que importa?

Desde as Sanzalas da Paz de Salazar que conhecemos estes figurinos, tanto quanto os próprios figurões.
  
Para quem não esta inserido no "sistema" (entenda-se abençoado pelo partido no poder), este "palácio" com chapas a fazer de telhado custa QUINHENTOS MIL DÓLARES, com garantia precária à distribuição regular de água e electricidade.  

Dói? Claro, é para doer! Leia mais uma vez de forma prática e sucinta:  
MEIO MILHÃO DE DÓLARES!
Vai precisar de alguma coisa para morar de facto e com algum conforto?
Pode começar por construir o reservatório de água, instalar a respectiva electro-bomba e os respectivos acessórios. Vai desejar o "luxo" da electricidade? Adquira o gerador alternativo de energia - previna-se, vai funcionar mais vezes do que pensa -, e habitue-se a ideia da "extorsão gasosa" para o reabastecimento de combustível. O regime dominante, no seu melhor estilo em arrogância e marketing, proíbe a venda de combustíveis fora dos automóveis e... já sabe! Estes extras vão custar-lhe cerca de TRINTA E CINCO MIL DÓLARES adicionais! Ui!!!
Falando em conforto, fica a sua consideração adquirir ou não os aparelhos de ar condicionado, substituir as horríveis torneiras e interruptores chineses de péssima qualidade e pior aplicação. Candelabros e cortinados acho que não vai querer mais, depois das despesas em insecticidas, reabastecimento de agua, manutenção de geradores e outros.

O condomínio não tem sinais de transito, e só os oligarcas podem construir nele os empreendimentos de agregação social e utilitários comerciais. Escolas, hospitais, laboratórios, estações de serviço, cinemas, livrarias, são investimentos sob reserva da nomenklatura.
Enfim, velhas praticas que acinzentam o Bairro Nova Vida.
À sua volta, reinam a desolação e a exclusão.



sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Libertar é fazer a revolução




Libertar é transformar pela violência uma ordem social estabelecida por minorias. E por isso mesmo libertar uma sociedade, é fazer a revolução. É preciso libertar o Homem não só do esclavagismo colonial, mas ainda de qualquer forma de dominação social no interior de cada país.
Nenhuma classe deve poder explorar outra.
Agostinho Neto

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

O Parlamento angolano e o Club de amigos (Entrevista)

ALIANÇA NACIONAL

«Eduardo dos Santos cospe sobre nós mas fá-lo também sobre culturas vulgarmente proclamadas como livres e civilizadas», diz o presidente da Aliança Nacional em entrevista ao Notícias Lusófonas. 

Com a causticidade que lhe é peculiar quando à colação são trazidas a situação política, social e económica do País, o presidente do partido Aliança Nacional (AN) vem - mais uma vez (desta feita a segunda, depois de, em 2005, ter concedido a sua primeira entrevista ao NL) - às páginas deste jornal dizer o que a maioria dos angolanos pensa (e quando pensa!) em silêncio.


Laurindo Neto bota a boca no trombone e, sempre igual a si mesmo (é, quem nasce direito jamais entorta!), afirma que o Parlamento angolano está transformado num “Club de Amigos”, cujo brinquedo é a produção de matéria legislativa. Vai mais longe ao dizer, por exemplo, que o Ocidente está de acordo com a dominação, corrupção e práticas desumanas existentes em Angola.

Por Jorge Eurico

Notícias Lusófonas (NL) - Sempre defendeu, de forma irredutível, a ideia segundo a qual, o País vivia sob o símbolo da tirania. As eleições realizadas o ano passado fizeram-lhe mudar de ideias?

Laurindo Neto (LN) - A farsa eleitoral confirmou o meu pensamento e alicerçou o ambiente tirânico.

NL - Explique-se melhor.

LN - Ao estrangular o processo democrático, com falta de precisão na realização das eleições e respeito pela norma constituinte, sendo criado um Tribunal Constitucional 30 anos depois da substituição do poder colonial, configurando o mesmo Tribunal em conflito de interesse, submetendo a Imprensa à vontade e interesses do regime, entre outros confirma a tirania. Ao transformar o Parlamento num “Club de Amigos” alicerça a tirania que terá como último brinquedo a produção de matéria legal.

NL - Como se traduz este ambiente tirânico?

LN – A vergonha que cobre a chamada camada intelectual traduz este ambiente. Chamados a tergiversar quanto ao estado da situação, louvaram hinos ao processo eleitoral e aos seus resultados, para logo à seguir dramatizar pelas situações calamitosas que assolam o País há décadas. Isto é feio! Não responsabiliza a população mas às suas elites. O rubor e o sentimento de humilhação cobriu-lhes também quando foram chamados a opinar sobre os “Cem dias de Obama”, sem que pudessem falar sobre “os 30 anos da Nova opressão e do estado calamitoso do País”. Isto é tirania.

NL - A camada intelectual tem culpas.

LN - Não tem culpas. Mas tem responsabilidades. A tirania e a ditadura são respaldadas por indivíduos tidos como intelectuais. Faço ressalva na expressão para não ferir indevidamente, pois que neste ambiente de falsificação social, falar de intelectuais e de sociedade civil é complicado.

NL – Os políticos na Oposição, onde o senhor está incluindo, cabem nesta acusação?

LN - A oposição tem militantes, a situação possui militares. É uma relação difícil. Assim sendo, indivíduos como eu - aceito - não encontram espaço no debate contraditório. Não têm acesso à divulgação dos esquemas corruptos que minam o Estado e a Nação. Não conseguimos a sensibilidade internacional, como sabe confusa entre a crise económica e a crise moral.

NL – Quer com essa afirmação desresponsabilizar a Oposição?

LN - Quero com essa afirmação testemunhar que Oposição nos moldes configurados pelos militares e aprovada tacitamente pela Diplomacia acreditada é apenas uma expressão de estilo, realçada pelos fazedores de "opinião encomendada".

NL - Quem são os fazedores de “opinião de encomenda”?

LN - São todos aqueles que aclamaram uma suposta vitória eleitoral para logo a seguir falarem de martelos demolidores contra a população; falta de higiene pública; falta de cidadania; clamam contra doenças erradicáveis etc. etc ou seja, clientes do regime, que acabam por envergonhar a nação angolana. Décadas de má gestão, homicídios publicamente conhecidos sem resolução, corrupção e intimidação mal camuflados, desconhecimento dos destinos da electricidade, petróleo, combustíveis, o que chamar a isto?

NL – Não está a pintar um quadro muito negro do País pós-eleitoral?

LN - Bom, o País tem que possuir muitos negros! Castigar negros é que me aborrece. É preciso que o mundo conheça isso: Um presidente não eleito está hoje (a entrevista foi feita dia 11 de Maio) a assistir ao empossamento do presidente da maior potência regional (África do Sul). Colocou em sentido as instituições democráticas de vários Estados ocidentais sob o mesmo engodo da falta de condições para a realização dos pleitos eleitorais. O que o mundo deseja fazer connosco?

NL - Quer responder a pergunta que deixa no ar?

LN - Falou-se num novo mundo a partir do 11 de Setembro. É esse? Apoio claro às ditaduras africanas, recuo claro diante de outras ditaduras em nome da crise. Relações de estratégia entre regimes democráticos e ditaduras verdadeiramente inúteis? Ditaduras sem sentido de Estado e de humanismo, para mais tarde irem à procura de terroristas. Serão terroristas os que tentarem contribuir para um mundo mais justo? Eu respondo que o nosso problema é esse. Lutamos em muitas frentes, sendo a maior delas a insensibilidade mundial.

NL - Está a dizer que o Ocidente cauciona a situação que presente se vive em Angola?

LN - Para todos os efeitos José Eduardo dos Santos é o Chefe de Estado angolano. Cessam os mesmos para efeitos temporais. Verga-nos e cospe sobre nós, mas fá-lo também sobre certo tipo de culturas vulgarmente proclamadas como livres e civilizadas. São elas que estão desnecessariamente expostas neste jogo de ambições exacerbadas, postergando as suas convicções em favor de práticas por si condenadas. É nisto que consiste a Arte do Possível, em que se torna possível condescender em todas as latitudes até no domínio das convicções. Na Nova Ordem Mundial é possível estar-se de acordo com dominação, corrupção e práticas desumanas. É claro, em nome das relações Estado a Estado, porque isso de relações Povo a Povo não é muito lucrativo por estes tempos.

NL - Qual é o sentimento do Povo angolano em relação a tudo isso?

LN - De raiva, de impotência, perante o desequilíbrio e a incoerência. Mas vai contornar.

NL - Vai contornar quando e como?

LN - Não somos fadados pelo pessimismo. A situação de dominação não é nova entre os angolanos. Fazemos parte de um Povo com tradição de luta, o que me possibilita a ante visão.

NL - Quando é que acha que essa situação poderá acabar?

LN - Depende do curso da História. Não estamos sozinhos. É preciso aguardar por catalisadores de mudança. Em França há sinais que levam à adopção de medidas contra riquezas ilícitas acumuladas por poderes públicos. Quem sabe todo o espaço europeu se lembre de legislar nesse sentido. No Brasil o cidadão está assumindo com garra a sua História. Chineses expatriados brutalmente poderão catalisar mudanças... Cubanos com oportunidade de conquistar a dignidade junto de outros povos, poderão fazê-lo... Em Portugal o Bloco de Esquerda dá sinal de consonância para com a sua História. Os Estados Unidos esquecidos do seu papel estão atravessando uma fase de redefinição da potência. É isso o mundo actual.

Situação social e económica do País é catastrófica

NL - Como caracteriza a actual situação social e económica dos angolanos?

LN - Catastrófica. O esquema de agradar excessivamente os de fora como táctica de entronização a partir do exterior está a rebentar com a economia do País... Vender energia para os outros e ver o cidadão morrer nas estradas sem iluminação é um truque que não durará sempre. Redefinir a arquitectura com recurso a poços, geradores, electro e moto bombas, pode ser lucrativo nas relações comerciais com o exterior mas aproxima o cidadão da ira. Oferecer um Novo Código de Estrada para uma Velha Conduta Governativa distrai mas não é solução. Temos que ser coerentes e verdadeiros. À Oriente não existe essa vocação, pelo menos nos termos definidos por outras civilizações - mas existiu a cultura da solidariedade. O problema é: numa altura em que a situação passou a ser extraordinariamente favorável à economia, haverá lugar para o humanismo?

NL - Como vai o processo de desarmamento da população armada pelo MPLA em 1992?

LN - Felizmente para mim a pergunta contém a resposta. Aquela faixa da população deve ter recebido lubrificantes para a conservação dos meios à sua disposição. A outra, para conforto do regime, foi para os guetos de onde se poderão defender com lamentações. O controlo da actividade económica, o controlo dos recursos naturais e a criação de barreiras com o objectivo de inviabilizar a realização de capital financeiro a quem não é situacionista é evidente; A falta de segurança pública é gritante; A deficiente administração pública é chocante.

NL - No meio de tudo isso, qual foi (é) a sorte do seu partido a Aliança Nacional?

LN - Foi a de ser uma organização detestada e imprópria para o Circo. Nao concorreu, logo, não foi "abençoada" com a extinção. Mas conheceu igualmente a humilhação geral. A gestão das nossas vidas, por forma a abafar o conhecimento e a vontade, por forma a precipitar a nostalgia, atinge a todos. Abstracção, suicídios, desenganos, serão o dia-a-dia de quem pugne pela auto estima. O partido em si procurará continuar os seus passos. Os cidadãos dirão o que querem em termos de pluralismo, mesmo que eu acredite estarmos no fim da intervenção pacifica. Clemenceau (ex-estadista francês) afirmou um dia que “Democracia é piolho comendo leão”. A tese está a ser escrupulosamente seguida por gente com poder em África, a ponto de se acreditar que ela não enche barriga. O que virá a seguir? Essa situação apesar de aparentemente esquecida poderá provocar rombos no xadrez político, uma vez que partidos não são ilegalizados, mas compulsados do Tribunal em que se inscreveram. A actividade respaldada na Lei tem o cunho do poder instituído. Porém quando exercida apenas com a vontade dos oprimidos, tem o cunho do perigo, mas não está necessariamente posta de parte.
Esta será uma das consequências da má Administração Pública do nosso País.